ITINERÁRIO VOCACIONAL

ITINERÁRIO VOCACIONAL

 

ITINERÁRIO VOCACIONAL

 

(Pe. Valnei Pamponet Oliveira, SDV)

 

 

CONDIDERAÇÕES INICIAIS

 

  • A vida obedece a etapas. A dimensão vocacional também é assim: entre o ponto de partida (chamado) e o ponto de chegada (resposta) está o itinerário.
  • Na semente, palavra e exemplo tão usados por Jesus, a árvore já está presente, mas em potencial, é uma possibilidade, e é o meio que vai determinar em grande parte o jeito, o tamanho, a qualidade dos frutos. (Mt 13, 3-9. 24-32)
  • Provérbio chinês: “as mais altas torres começam no chão”.
  • A pessoa humana é “um projeto a ser realizado mediante a liberdade”, algo que ainda pode ser manifestar.
  • O ser humano é ser itinerante.

 

INÍCIO DO ITINERÁRIO

 

  • Todo processo tem seu início. O início do itinerário espiritual está no mistério do Pai amoroso que “por decisão inteiramente livre e insondável da sua bondade e sabedoria, criou o universo, decretou elevar os homens à participação da sua vida divina e não os abandonou quando pecaram em Adão” (LG 02). Este ato de amor atua concretamente desde a concepção (Jr 1, 5), capacitando-nos para realizar seu plano de comunhão.
  • Esta realidade é percebida aos poucos. E se à pessoa é oferecida condições, meios, experiências que possam ajudá-la a tomar consciência de sua realidade vocacional. Aqui já se faz evidente a importância de uma pastoral organizada, que ajude as pessoas a se despertarem para esta realidade vocacional.
  • No itinerário vocacional há uma dupla perspectiva: de um lado, Deus Trindade que chama e, de outro, há uma pessoa humana que responde.
  • O itinerário conta com uma dimensão teândrica. Seu início é com a fé. “Uma adesão pessoal a Deus” (CIC 150). “Uma atitude existencial e dialógica que impregna toda a existência da pessoa, diante do apelo de um ser pessoal” (Alszeghy, Z. & Flik, M. 1979).
  • A fé supõe um amadurecimento humano adequado. Para poder dar uma resposta coerente a Deus, e esta resposta já é propriamente um ato de fé. Amadurecimento humano adequado é: quando criança, dar resposta a Deus como criança; se jovem, dar resposta a Deus como jovem; se adulto, como adulto. Isto é algo lógico, porém na realidade de hoje, as coisas não são bem assim, há muitas pessoas vivendo ou etapas que já deveriam ter passado, ou vivendo etapas que ainda estão por vir.
  • A fé é o pré-requisito básico para toda ação humana amadurecida por que a dimensão transcendente é a dimensão essencial do ser humano. Fomos chamados à vida por Deus e para Deus. Segundo Hans Urs von Balthasar “é necessário considerar a dimensão da relação com Deus, com o eterno e o absoluto, que afinal é a única que confere sentido a todas as relações humanas”. (Lukas, Elisabeth. Psicologia da Vida espiritual, Paulus, 2002).
  • Tendo a fé como ponto de partida no itinerário vocacional, podemos entender como “grande multidão de eleitos (...) suportaram muitos ultrajes e torturas e se transformaram no mais belo exemplo entre nós” (CLEMENTE DE ROMA, Carta aos Coríntios 6, 1). Mas quando a fé está ausente e imatura pode acontecer como um jovem que após um ano de sua ordenação, “pegou um pedaço de papel qualquer e aí jogou essas inacreditáveis palavras: ‘ renuncio a todos os meus compromissos de frade e de padre e parto para outra’. Assinou e enfiou o papel debaixo da porta do quarto do Prior e foi fazer a sesta. Desse jeito, sem o mínimo sentimento da gravidade do que estava fazendo e sem o menor peso na consciência” (Boff, C. Considerações indignadas sobre a formação religiosa hoje. Convergência, 319 (1999), p. 39). Este é um exemplo entre tantos que temos no mundo de insensibilidade total ao ser humano, aos princípios, às leis sociais, à vida, e nos perguntamos para onde caminha a relação entre as pessoas hoje e Deus? Quanto mais Deus é deixado de lado, mais o ser humano perde-se em suas relações. Isto em todos os níveis de relação humana, familiar, conjugal, profissional, social.

 

ITINERÁRIO PARA UM FIM

 

  • Novamente, quando falamos de itinerário isto implica em um ponto de partida e um ponto de chegada.
  • A “vocação é um chamamento, uma destinação e um futuro. Perguntar pela vocação de alguma coisa ou de alguém é perguntar a que ele está destinado e a qual futuro está chamado” (Boff, L. O destino do homem e do mundo, Vozes, 1998, p. 15). Pensar itinerário humano é pensar no caminhar da pessoa rumo ao fim. Esse fim é essencial, é o sentido que mais tarde vamos explorar melhor. Se a clareza quanto ao fim vier a faltar, o ser humano “simplesmente não existiria; e se, o homem agir contra esse finalidade, se auto destrói” (PIGNA, A. Vocação: teologia e discernimento. Loyola, 1989, p. 16).
  • O fim é, na dinâmica da Trindade, que “oferece ao homem a liberdade, com a qual ele pode aderir plenamente à sua Revelação” (Oliveira, J.L.M. A vocação à união divina, Spiritus Domini, 1991, p. 41). Vocação é convite, proposta de um Deus amoroso, que desde a criação convida-nos: vem.
  • Se há um fim, é importantíssimo ter bastante clareza sobre o mesmo. Se não há clareza corre-se o risco de fazer confusão entre o essencial e o secundário. No aspecto vocacional esta confusão é favorecida pelo fato de usarmos a mesma palavra, “vocação”, para designar realidades diversas (dimensões da vocação, vocações especificas, carismas de congregações, profissões, etc).  
  • O fim do itinerário vocacional, a vocação por excelência é prioritariamente o chamado à comunhão com Deus e tudo que Ele ama. Todos os aspectos da vocação são importantes, mas “o decisivo e absolutamente imprescindível é situar-se no caminho para Deus. Tudo o mais, as formas, as articulações históricas e as várias estradas, é relativo” (Boff, L. Op. Cit, p. 37). “Uma Pastoral Vocacional verdadeira, autêntica, não começa com a preocupação pelas vocações específicas”, mas tem como prioridade “a promoção da vocação universal à santidade” (Oliveira, J.L.M. Os passos da Pastoral Vocacional, Espírito, 57 (1993), p. 06).

 

 

 

 

ETAPAS DA ITINERÂNCIA

 

  • O itinerário é algo que se faz aos poucos, parte por parte, etapa por etapa. Quando não se tem claro isto de que “o ser humano cresce lentamente como organismo vivo, como consciência psíquica e, mais lentamente ainda, como consciência espiritual” (Rubio, A.G. Nova evangelização e maturidade afetiva. Paulinas, 1993, p. 79), corre-se o risco de se pensar o itinerário vocacional como algo sem sentido, caótico, que se percorre de qualquer forma. Temos que ter em mente a imagem da semente, que, aos poucos, etapa por etapa, vai tornando-se uma árvore. O itinerário é o conjunto das diversas etapas entre o ponto de partida e o ponto de chegada.
  • Nas diversas realidades humanas há sempre etapas, por exemplo, o amadurecimento psicossomático (criança, adolescente, jovem, adulto, idoso), a construção de uma família (namoro, noivado , casamento), a educação (ensino básico, fundamental, médio, superior), a formação para a Vida Religiosa (pastoral vocacional, aspirantado, postulantado, noviciado, juniorato, profissão solene). Não deve ser rigidamente, mas em várias realidades humanas, passa-se por etapas evolutivas.
  • Uma vez conhecida as etapas do itinerário vocacional é preciso respeito a este processo. Aqui é bem aplicado o princípio de Leibniz: “a natureza não dá saltos”. Não se passa de uma etapa para outra sem o conveniente amadurecimento e quanto melhor e mais sólido for cada passo, melhores serão os resultados. “A natureza sempre fará seu percurso dentro do seu tempo e ritmo, e cada etapa não vivida fará falta adiante”. E cada pessoa é um ser irrepetível, cada uma possui seu ritmo e modo de ser.
  • Toda orientação vocacional deverá considerar o fator da individualidade. É preciso ter presente a pessoa concreta, com sua história, sua herança genética, sua personalidade, sem esperar que todos reajam da mesma forma diante do chamado de Deus.
  • É preciso também ter claro que “a resposta ao chamado da Trindade não acontece de maneira isolada, individualista, fechada, mas de forma comunitária, já que também a convocação divina é dirigida à pessoa humana por meio da comunidade” (Oliveira, J. J.M. Teologia da vocação, Loyola – IPV, 1999, p. 47). Deus chama na comunidade para a vivência da fé na comunidade. Fugir destes dois importantes pólos da vida humana (individualidade e coletividade) é descaracterizar a pessoa.
  • A pessoa humana é um ser itinerante que, passo a passo, após descobrir a vida de fé, caminha para a pátria definitiva. É um ser que, ao descobrir o chamado divino, dispõe-se, com o auxílio da graça, a caminhar. Seguindo os passos de um itinerário vocacional sem pressa seremos capazes de responder adequadamente ao chamado de Deus e esta resposta tem o auxílio da Trindade Santa, que nos acompanha a todo instante, caso contrário não seria possível responder ao chamado.

 

 

 

 

 

 

 

AS ETAPAS DO ITINERÁRIO VOCACIONAL

 

(Documento 55, Paulinas, 1995 – CNBB sobre a formação dos presbíteros da Igreja no Brasil) – A partir da Reflexões do Pe. José Lisboa Moreira de Oliveira, SDV – Revista Espírito, nº 65 Jan – Mar 1996.

 

  1. DESPERTAR

 

  • Todas as pessoas que fazem parte da comunidade cristã devem tomar consciência de que são chamadas pelo Pai, por meio de Jesus Cristo, na ação do Espírito, para uma missão bem específica na Igreja.
  • A etapa do despertar é permanente e deve visar todos os componentes do Povo de Deus. Todos e todas precisamos sempre sermos “sacudidos”, despertados para nos comprometermos mais com o Reino!
  • A etapa do despertar acontece progressivamente em três níveis:

 

1.      Despertar para a dimensão humana da vocação. Nosso primeiro chamado é para ser gente, pessoa, cultivando aqueles valores que caracterizam o ser humano enquanto tal. Fracassamos em nossas experiências vocacionais com as pessoas porque queremos que elas abracem valores próprios de uma vocação específica, quando não são ainda nem mesmo pessoas humanas, com aquelas qualidades e atitudes inerentes ao ser homem ou ser mulher. (Atividades que ajudem o jovem ou adulto vocacionado a se conhecer, visitar principalmente seu passado, suas origens, sua história, assumir-se com todas as alegrias, e tristezas, realizações e frustrações, assumir as feridas, descobri-las para poderem ser tratadas. Construir a identidade).

 

2.      Despertar para a vivencia do compromisso batismal. Construir a identidade cristã para o exercício fiel da missão que nasce a partir do batismo que recebemos. Também aqui costumamos pecar muito, pois com muita facilidade tendemos a logo transformar pessoas em padres, frades e freiras, sem antes nos perguntarmos se tais pessoas são, de fato, cristãs. As conseqüências desta precipitação são conhecidas de todos e de todas: padres, religiosos, religiosas com sede de poder, de dominação, com manias autoritárias, incapazes de dialogar, de perdoar e, sobretudo, incapazes de amar. (Atividades que levem ao aprofundamento bíblico, conhecer a Bíblia, sua estrutura, suas origens, conhecer a teologia bíblica, construir a síntese da História da Salvação [para salvar a humanidade, Deus escolhe e prepara um povo que é o símbolo de toda a humanidade, prepara este povo pelos seus líderes e profeta até que Ele mesmo vem, na pessoa do Filho, e Deus mostra sua imagem, que é igual a nossa, e nos convida a sermos a sua semelhança, termos o seu caráter: o amor. Encarna-se na humanidade, dá à luz pela sua Morte e Ressurreição ao novo Povo de Deus, a Igreja que deve continuar tendo em seu íntimo o Cristo, sacralizando o mundo] e, indispensável, para que o conhecimento teológico desça ao coração, que se ofereça experiências de vulnerabilidade humana, visitando hospitais, áreas de carência, ansionatos, orfanatos, realizando acampamentos de missões).

 

3.      O terceiro nível refere-se justamente à dimensão eclesial da vocação. É preciso despertar para a concretização do compromisso batismal. Fazer as pessoas perceberem que não é possível ser cristão ou cristã de forma “genérica” (e ninguém nasceu para isso, se a criança e o jovem desde o início encontrarem abertura na Igreja para participarem da liturgia, das pastorais, vão ser sempre atuantes na Igreja, por que a participação naturalmente dá prazer, o ser humano nasceu para ser eclesial), mas somente no ato de assumir compromissos concretos, serviços específicos, dentro da comunidade. Neste nível enfatiza-se muito esta dimensão do serviço que deve caracterizar sempre a existência cristã. o ser verdadeiramente homem ou mulher, cristão ou cristã, acontece tão somente quando somos capazes de sair de nós mesmos para irmos ao encontro dos outros e das outras na doação, no dar a vida, na solidariedade).

 

ELEMENTOS QUE NÃO PODEM FALTAR:

 

  • É indispensável uma comunidade viva, onde o espírito de comunhão e participação se faz presente. Uma comunidade onde os carismas, ministérios e serviços encontram amplo espaço.
  • Se a comunidade é apática, o primeiro serviço do SAV é ressuscitar o dinamismo da vida cristã.
  • As atividades do despertar precisam ter uma continuidade. Não podem ser esporádicas.
  • É necessário organização e planejamento.
  • Já se ter o cuidado com os problemas humanos, especialmente aqueles relacionados com a afetividade e a sexualidade.

 

  1. DISCERNIR

 

  • Acontecendo o despertar muitas pessoas sentir-se-ão “incomodadas” por Deus. Terão o desejo louco de seguir o Mestre por onde ele for. Neste momento entra em ação o processo de discernimento. Trata-se de verificar se os sinais são mesmo indicadores de um verdadeiro chamado da Trindade.
  • O processo de discernimento, tendo presente a pedagogia usada por Jesus nos evangelhos, questiona as motivações (Jo 6, 60 – 69), sonda as intenções, alerta para a radicalidade e a seriedade da opção (Jo 21, 15 – 18).
  • Muitas vezes “limpa” o caminho, remove obstáculos, ajuda a clarear.
  • Outras vezes dificulta, põe impecilhos, procura provar.
  • Verdadeiro discernimento não é só aquele que conduz a um “final feliz” para o vocacionado ou vocacionada. Muitas vezes o discernimento conduz a uma conclusão decepcionante: faz a pessoa a dar de cara com a sua ilusão, obrigando-a a buscar outro caminho e a perceber que o que ela queria não estava no projeto divino e, portanto, não era o melhor para ela (Mc 5, 18 – 20).
  • Quem ajuda a fazer o discernimento não deve esquecer que os principais agentes deste processo são, Deus, através de seu Espírito Santo, e o próprio vocacionado ou vocacionada. Todavia não deve esquecer o seu papel de interlocutor divino. Por isso o agente do SAV deve preparar-se bem em todos os aspectos, para esta nobre missão.

 

 

 

 

            ELEMENTOS QUE NÃO PODEM FALTAR:

 

  • Levar em conta não apenas as aptidões do vocacionado ou vocacionada, mas sobretudo as motivações. O que realmente está levando esta pessoa a buscar este tipo de vocação específica? O que está motivando-a? É importante conhecer bem o vocacionado ou vocacionada: sua história, sua cultura, sua família, etc.
  • O objetivo desta etapa é fazer com que a pessoa passe de motivações insuficientes e inadequadas para uma motivação madura e adequada.
  • No caso em que as motivações se revelem inválidas ou imaturas, isto é, infantis, fantasiosas, irreais, egocêntricas, não sendo possível uma mudança, o discernimento deve levar o vocacionado ou vocacionada a desistir ou de forma definitiva ou então até que esteja mais consciente da realidade da vida.
  • É bom ter ajuda de pessoas experientes no processo: psicólogos, terapeutas ocupacionais, orientadores espirituais, pedagogos, teólogos, casais, etc.

 

  1. CULTIVAR OU DESENVOLVER

 

  • Esta é a nova etapa que foi incluída no documento dos Bispos do Brasil. Ela já estava presente subentendida nas outras três, mas sua explicitação é importantíssima.
  • É trabalhar com mais atenção e a fundo os sinais do chamado divino, verificados e percebidos durante o processo de discernimento.
  • Não basta constatar a existência de sinais autênticos de vocação. É preciso que haja um espaço de tempo reservado para “alimentar” estes sinais. É o voltar sempre ao primeiro amor, ao primeiro chamado, aos primeiros sinais. Visitar os primeiros encontros com Deus. Em outras palavras: não se pode passar imediatamente do discernimento para a opção por uma vocação específica. A pessoa precisa ser preparada para tal opção.
  • É preciso superar o imediatismo que tantas vezes caracteriza o processo do itinerário vocacional. O medo de perder vocações leva tantas vezes à pressa, à precipitação, àquela atitude de direcionar as pessoas. Isso acontece sobretudo no âmbito da vida consagrada e do sacerdócio. Muitas vezes falta a eclesialidade, o querer as vocações para a Igreja. por isso já o discernimento é direcionado, bitolado, redutivo. O jovem ou a jovem termina optando por esta congregação, pelo clero diocesano por não conhecer outras alternativas.
  • Esta etapa do itinerário desperta para uma PV mais “global”, mais integral, aberta a todas as vocações. O ato de cultivar supõe a possibilidade da descoberta de outras perspectivas. Levar o vocacionado ou vocacionada a perceber que existem outras possibilidades, outras alternativas, além desta congregação ou desta forma de ser padre. A proposta desta nova etapa rompe uma vez por todas com aquela PV de “pescaria”, preocupada somente, de forma egoísta, em “puxar a brasa para a própria sardinha”. Ela coloca a PV – mesmo aquela de uma congregação religiosa – no coração da Igreja. faz a PV ser realmente “católica”, universal, voltada para a promoção de todas as vocações e não apenas para os interesses deste ou daquele grupo.

 

 

 

ELEMENTOS QUE NÃO PODEM FALTAR:

 

  • Que esta etapa seja caracterizada pelo aprofundamento em três níveis: espiritualidade, reflexão e ação.
  • Na espiritualidade levar a fazer uma experiência, cada vez mais intensa, da comunhão com a Trindade, a partir da opção que está sendo feita.
  • No nível da reflexão, a pessoa deve contar com subsídios e com uma catequese que a ajude a perceber, com maior clareza, para onde ela está andando.
  • No nível da ação, levar a experimentar, sem enfeites, o estilo de vida que está sendo chamado ou chamada a viver.
  • Nesta fase do itinerário a atenção à inculturação deve ser redobrada. Deve-se evitar o perigo da manipulação da vocação alheia, “forçando” alguém a escolher o que a gente quer. É importante que o cultivo seja multiforme, na vida pluriforme suscitada pelo Espírito no meio do Povo de Deus.

 

 

  1. ACOMPANHAR

 

  • Tem por objetivo “acompanhar o processo de opção vocacional consciente e livre” (CNBB 55, 27) do vocacionado ou vocacionada. É um processo. Um itinerário. “Caminhando se faz o caminho”. A opção vai amadurecendo ao poucos. Nenhum vocacionado ou vocacionada inicia o seu itinerário já sabendo o que quer. A opção se aproxima do final, mas o final mesmo, sempre está por vir. É necessário paciência, calma, espera, firmeza e coragem da parte de quem acompanha.
  • É indispensável a presença constante do orientador ou orientadora vocacional durante o processo. Esta pessoa é aquela que sempre “estende a mão” ao vocacionado ou vocacionada. Seu papel não é o de ser “muleta”, que gera dependência e estagnação, mas o de ser companheiro, companheira de caminhada, ajudando sempre mais a pessoa a firmar-se e a andar com os próprios pés.
  • E a partir que a opção foi feita, quem orienta não deve abandonar o vocacionado ou vocacionada, mas deve encaminha-lo às instituições que darão continuidade a este processo vocacional. É necessário que haja uma verdaderia interação entre a PV e tais instituições. Não raro nota-se uma discrepância entre o acompanhamento dado pela PV e aquele das instituições formativas.
  • Os métodos de acompanhamento devem libertar o vocacionado ou vocacionada e não amarrar. As pessoas precisam vencer os próprios condicionamentos que impedem uma resposta verdadeiramente livre. A opção deve ser consciente, isto é, quem responde deve saber plenamente o que está fazendo. Aparece aqui o valor do acompanhamento psicológico que é indispensável. Precisamos quebrar o tabu da psicologia, principalmente na formação da Igreja.
  • No itinerário vocacional nada deve ser imposto. Tudo deve ser proposto, na dinâmica da própria vocação: “se queres...” (Mt 19, 21).

 

ELEMENTOS QUE NÃO PODEM FALTAR:

 

  • Um sadio equilíbrio entre o acompanhamento individual e aquele grupal. O acompanhamento individual vida a personificação da vocação. Ajudar a pessoa a ser ela mesma, a responder, de forma única e irrepetível, o chamado que lhe foi feito pela Trindade.
  • O acompanhamento grupal tem como objetivo ajudar o vocacionado ou vocacionada a inserir-se na comunidade, lugar onde necessariamente a vocação tem que ser vivida. Leva-los a compreender que avocação é um dom para os outros, para a comunidade.
  • Capacitação dos orientadores e orientadoras vocacionais, bem como investimento na aquisição de meios para realizar tal trabalho.
  • Ter muita eclesialidade. A PV deve estar sempre aberta a todas as vocações existentes na Igreja. Sem tal eclesialidade o acompanhamento corre o risco de ser “direcionamento”.

 

 

 

DESAFIOS PARA O ITINERÁRIO VOCACIONAL

 

  1. NÃO QUEIMAR ETAPAS

 

  • A ânsia de ver logo o jovem ou a jovem no lugar que a gente deseja, pode levar o animador ou animadora vocacional a deixar de lado não só uma das etapas mas também aspectos importantes de uma delas. Existe quem muitas vezes entusiasma-se com certas coisas e logo deduz que o vocacionado ou vocacionada está preparado, preparada. Com isso passa por cima de elementos importantíssimos que só mais tarde vão se revelar.
  • Há ainda no itinerário vocacional muita pressa. Bispos, superiores e superioras querem ver os seminários e as casas de formação “cheios” de candidatos e candidatas. A pressão sobre os formadores e formadoras é bem forte. Vence a pressa e a precipitação. Ganha a mediocridade. A comunidade paga as conseqüências. A igreja sofre.
  • Outro fator importantíssimo que ainda é tabu, e precisa urgente ser bem trabalhado com toda a transparência possível é o humano-afetivo-sexual. Que é a base de todo o ser humano. Se esta dimensão não está bem resolvida a dimensão espiritual e relacional com Deus e consigo mesmo e com os demais não poderá crescer.

 

  1. MANTER O EQUILÍBRIO ENTRE VIVENCIA E CONTEÚDO

 

  • Muitos animadores enfatizam muito a vivencia em detrimento do conteúdo, ou seja, da catequese. E em nossa igreja há ainda um grande déficit bíblico-catequético. Bem poucos cristãos tem acesso ao rico patrimônio espiritual da Igreja católica judaico-cristã.
  • Em outros casos reduzem o ITER vocacional a uma teoria, à aprendizagem de conhecimentos teóricos, ignorando o valor da vida, da experiência. O ideal é tentar manter o equilíbrio entre as duas dimensões, de modo que a experiência da vida seja alimentada e reforçada pela reflexão e pela catequese e esta possa ser concretizada na e pela realidade. Só experiências pode tornar o jovem ou a jovem um aventureiro ou aventureira, mas sem muita consistência e resistência. Somente um autentica catequese vocacional poderá criar convicções que ajudem a pessoa a resistir às provocações do hedonismo e do consumismo. Por outro lado, se o itinerário é feito só de conteúdo, poderemos ter “grandes cabeças”, de gente que sabe tudo, mas incapaz de traduzir isto na prática.

 

  1. PROMOVER TODAS AS VOCAÇÕES NA IGREJA E PARA A IGREJA

 

  • Com muita facilidade tendemos a enfatizar um determinado tipo de vocação, chegando muitas vezes a fazer pouco caso das demais.
  • Há um eco-sistema vocacional, ou seja, cada vocação específica na Igreja está intimamente relacionada com as demais. Quando uma é atingida todas as outras sofrem as conseqüências. Não se pode promover uma e esquecer outras.
  • Mesmo depois do Concílio Vaticano II, ainda há quem insista em dar ênfase às vocações de “especial consagração”, especialmente à vocação ao presbiterato. A vocação da cristã e do cristão fiel fica relegada a uma segundo plano, quando não é totalmente esquecida. Tende-se a considerar o cristão e a cristã fiel, como cristãos de segunda categoria, sem importância para a vitalidade cristã. Nossa Igreja é Povo de Deus, onde todos e todas, exercendo funções e abraçando carismas diferentes e complementares, possuem igual valor e mesma dignidade (LG 32). (Povo Sacerdotal, Profeta e Rei. Diáconos, presbíteros, episcopos são Ordens que a Igreja dá a determinadas pessoas para exercer o sacerdócio e o poder da Assembléia sacerdotal em nome desta Assembléia sacerdotal, representam o Cristo Cabeça na mística da Igreja Corpo de Cristo).
  • Não promover a vocação do fiel e da fiel cristã é esquecer do húmus, o terreno fértil, no qual crescem as demais vocações é a vida comprometida dos leigos e das leigas. Esperar que brotem vocações para a vida consagrada e para o sacerdócio ordenado numa Igreja onde os fiéis e as fiéis não vivem intensamente a sua missão, são excluídos de uma autentica participação, é como esperar colher cereais no deserto.