O LIVRO DE JÓ

O LIVRO DE JÓ

 

SAPIENCIAIS

O LIVRO DE JÓ

Luis Staldelmann

Anthony R. Ceresko

“Deus fala misturado nas coisas: os olhos da gente percebem só as coisas, mas a fé enxerga Deus que aí nos fala!”

Um agricultor

CRONOLOGIA DOS LIVROS DA BÍBLICA

(a.C.)

ÉPOCA HISTÓRICA

LIVROS DO PENTATEUCO

LIVROS HISTÓRICOS

LIVROS SAPIENCIAIS

LIVROS PROFÉTICOS

PAIS E MÃES

ÊXODO

TRIBALISMO

(até 1.040)

Tradições Orais sobre as famílias e a história

Tradições sobre os Juízes. Tradições sobre a Arca (1 Sm 4 – 7)

Tradições das famílias.

Sabedoria Popular.

Religiosidade popular.

Os videntes

(1 Sm 9, 9)

REINO UNIDO SOB DAVI E SALOMÃO

(1.040 a 931)

1° Redação das tradições dos patriarcas, do Êxodo e das tribos

Anais da Corte.

1° Redação da história: “História da ascenção de Davi” (1 Sm 16, 1 até 2 Sm 5)

Alguns Salmos

Alguns Provérbios

Confrarias proféticas de Samuel

(1 Sm 10, 5 – 6)

         

 

ÉPOCA HISTÓRICA

LIVROS DO PENTATEUCO

LIVROS HISTÓRICOS

LIVROS SAPIENCIAIS

LIVROS PROFÉTICOS

REINO DE ISRAEL NO NORTE

(931 a 722)

2° Redação das antigas tradições.

Dt 12 - 26

Anais da Corte.

2° Redação: Ciclo de Elias e Eliseu (1 Sm 13 – 15; 1 Rs 17 – 2 Rs 12)

Alguns Salmos

Alguns Provérbios

Irmandade de Elias e Eliseu

(2 Rs 2, 1 – 18)

Am e Os

REINO DE JUDÁ NO SUL

(931 a 586)

Últimas décadas da Monarquia

Dt 4, 44 – 11, 32; 28, 1 ss

Anais da Corte.

1° Redação da Obra Histórica Deuteronomista sob a reforma de Josias.

Alguns Salmos.

Coleções de Provérbios:

Pr 10, 1 – 22, 10; Pr 25 – 29

Is 1 – 39 e Mq

Sf, Jr, Na, Hab

 

 

 

 

 

ÉPOCA HISTÓRICA

LIVROS DO PENTATEUCO

LIVROS HISTÓRICOS

LIVROS SAPIENCIAIS

LIVROS PROFÉTICOS

SOB A DOMINAÇÃO BABILÔNICA

(586 a 539)

3° Redação das antigas tradições.

Lv 17 – 25

Dt 1, 1- 4, 43; 29 ss

Redação final da “Obra Histórica Deuteronomista”

Js, Jz, 1 – 1 Sm; 1 – 2 Rs

Alguns Salmos

Alguns Provérbios

Pr 22, 17 - 24

Ez, Is 40 – 55, Ab, Lm

Releitura da Profecia

SOB OS PERSAS

(539 a 332)

Redação final do Pentateuco

(Gn, Ex, Lv, Nm, Dt)

Obra histórica Cronista

(1 – 2 Cr, Esd, Ne) Rt

Jó, Ct

Compilação do Livro dos Salmos e dos Provérbios

Ag, Zc 1 – 8, Is 56 – 66, Ml, Jl.

Releitura da Profecia.

Jn, Is 32 - 35

 

ÉPOCA HISTÓRICA

LIVROS DO PENTATEUCO

LIVROS HISTÓRICOS

LIVROS SAPIENCIAIS

LIVROS PROFÉTICOS

SOB OS GREGOS

(332 a 142)

 

Est, Tb, Jt

1 – 2 Mc

Ecl, Eclo, Sb

Zc 9 – 14, Dn, Br

Apocalíptica:

Dn, Is 24 – 27

Ez 38 - 39

 

TA-NA-KH

(A Bíblia Judaica)

 

TORÁ

(Gênesis, Êxodo, Levítico, Números, Deuteronômio)

NEBIIM

(Profetas)

Anteriores: Js, Jz, (1-2) Sm, (1-2) Rs.
Posteriores: Is, Jr, Ez

Menores: Os, Jl, Am, Ab, Jn, Mq, Na, Hab, Sf, Ag, Zc, Ml

KETUBIIM

(Escritos)

Sl, Jó, Pr, Rt, Ct, Ecl, Lm, Est, Dn, Esd-Ne, (1+2) Cr

 

 

A BÍBLIA = Biblos (Coleção)

 

Bíblia Judaica 39 livros

(Não possui: Tobias, Judite, I Macabeus, II Macabeus, Baruc, Sabedoria, e partes do Livro de Esther e Daniel)

Foram escritos, a maioria em hebraico, mas quando os rabinos, nos anos 80 d. C. fizeram o canon judaico, só tinham cópias em gregos desses livros.

 

Bíblia luterana 39 (P.T.) + 27 (N.T.) = 66 livros

Martin Lutero traduz direto da Bíblia judaica para o Alemão

 

Bíblia Católica 46 + 27 = 73 livros (7 livros escritos em língua grega:)

(Possui:Tobias, Judite, I Macabeus, II Macabeus, Baruc, Sabedoria, e partes do Livro de Esther e Daniel)

Muitos pais da Igreja, como S. Jerônimo, ficaram em dúvidas com relação a estes livros até o Concílio de Trento (1546) quando a Igreja definiu que estes sete livros deveriam ser aceitos “com igual devoção e reverência”.

O mesmo aconteceu com os livros no N.T.: Hebreus, 2 Pedro (Estilo diferente das Cartas de Paulo e da 1 Pedro), Tiago, Judas (Questões doutrinais suspeitas), 2 e 3 João (Temáticas que pareciam não ter muita importância) e Apocalipse (Muito obscuro), somente no Concílio de Trento (1546) que são aceitos no cânon tradicional.

 

Foi Deus quem escreveu?

Sábios hebreus

(Com a ajuda de homens e mulheres, jovens e idosos, profetas e profetisas, pastores e agricultores, artesãos e pescadores, justos e pecadores)

Inteligência + Observação do Cosmos + Inspiração Divina

 

 

NOMES DO POVO DE DEUS

HEBREU = Hapirú (Povo que passa)

ISRAEL = Israel filho de Isaac, neto de Abraão que depois de lutar com o Anjo muda o nome de Jacó para Israel (Quem briga com Deus)

JUDEU = Povo que descende de Judá, Reino que sobrevive às dominações.

 

Autoria Bíblica

(Homenagem do Povo Judeu aos personagens importantes de sua história)

PENTATEUCO – Moisés: Patrono de toda a Lei

(Vive 1.275 – Escrito 931)

Ex:

Dt 1, 5 (Terceira pessoa)/ 34 (Sua morte)

SALMOS – Davi : Patrono da Oração

(Grande promotor do culto em Jerusalém)

SABEDORIA – Salomão: Patrono da Sabedoria

 

As duas Linguagens da Bíblia

Histórica

(Mas envolta em Teologia)

Teológica

(Simbólica – “Corações ao alto” – elevar os olhos e o pensamento)

 

O LIVRO DE JÓ

Obra-prima entre os livros sapienciais, digna de figurar entre as melhores obras da literatura universal.

É um poema dramático-religioso que discute, em profundidade e com grande paixão retórica, o tema da transformação do homem, do sentido do sofrimento na vida humana e da doutrina da retribuição.

 

ESTRUTURA (09 partes)

1. O Prólogo

(1 – 2)

2. Primeiro discurso

(3 – 14)

3. Segundo discurso

(15 – 21)

4. Terceiro discurso

(22 – 27)

5. Interlúdio para elogia da Sabedoria

(28)

6. Solilóquio do protagonista

(29 – 31)

7. Intervenção de Eliú

(32 – 37)

8. Manifestação de Deus

(38, 1 – 42, 6)

9. Epílogo

(42, 7 – 17)

 

ORÍGEM E ACRÉSCIMOS

Diversidades no vocabulário, no estilo e no ambiente cultural e religioso dão a entender que o livro foi escrito por etapas.

Resquícios de vocabulário do período persa e algumas circunstâncias históricas e culturais fazem supor que ele tenha surgido no século V ou IV a. C.

O prólogo e o epílogo são reformulação literária de um conto didático da tradição oral dos sábios do antigo Oriente Médio não-israelita

 

CONTEÚDO TEOLÓGICO

O Livro de Jó não é, como poderia parecer ao leitor apressado, uma estéril discussão filosófica sobre o sofrimento, por ocasião de uma terrível tragédia, somente superada com a intervenção de Deus, que restabelece seu servo Jó na feliz situação primitiva.

O objetivo do livro não é mostrar como Jó supera a desgraça, para voltar a ser o que era antes, ...

...mas analisar e celebrar a radical transformação de um homem, inesperadamente reduzido à extrema miséria e humilhação, ...

...mas reerguido, através do sofrimento, a outro nível de existência, mais autêntica e mais humana, mais meritória e mais gloriosa que a primitiva, privilegiada e paradisíaca.

1,1 – 2, 13

A transformação de Jó desenvolve-se em três etapas:

A SITUAÇÃO PRIVILEGIADA

No prólogo, a figura de Jó suscita admiração, apenas admiração.

Homem de vida impoluta em meio a tantas riquezas e honras,...

... ele vive na inocência e simplicidade, alheio à ganância e avareza e aos prazeres da vida,...

... mostrando seu bom coração na generosidade para com os necessitados...

Jó 31

... Justo e íntegro, temente a Deus, ele “era o mais famoso entre todos os filhos do Oriente” (1, 3).

Todas as suas qualidades sociais, éticas e religiosas alcançam o mais alto grau, e o próprio Deus se compraz em dar-lhe testemunho de que “não há outro igual”

(1, 8).

Jó não parece um simples mortal...

Cumulado de bençãos e superprotegido, falta-lhe o sentido da luta e da conquista...

Suas virtudes não têm o mesmo mérito da fidelidade em meio a trabalhos e frustrações, perigos e tentações...

Jó não é um dos nossos...

Inatingível, imune à nossa dolorosa experiência neste mundo adverso e falaz, ele goza dos privilégios de Adão, no Paraíso.

A PROVAÇÃO

Repentinamente expulso de seu paraíso, não pelo pecado, mas pelo sofrimento, Jó desce, não degrau por degrau, mas de roldão...

Até o mais baixo grau do homem caído e desamparado,...

Para participar do triste destino dos exilados filhos de Adão.

Forçado a assumir sua estranha e difícil condição de homem degradado e a ambientar-se nessa nova realidade,...

Ele passa por um longo e doloroso processo de maturação e purificação,...

Até atingir, no epílogo, um nível de perfeição bem mais alto do que no estado inicial.

A des-graça de Jó torna-se assim sua redenção.

Que transformação operou na mente e no coração desse homem sua experiência devastadora?

No tempo de seu bem estar e prosperidade, ele é caridoso com todos, indulgente com os escravos, benévolo com os infelizes e, embora poupado ao sofrimento, é compassivo com os que sofrem.

Não lhe falta consciência do sofrimento da humanidade...

Falta-lhe a percepção de um possível problema de relação para com Deus:

A doutrina da Retribuição

A doutrina tradicional a respeito da retribuição assegura a Jó, e a todos os que praticam a justiça, a amizade de Deus.

Jó tem a firme convicção de que tudo que lhe acontece provém do ato deliberado de Deus, e Deus não poderia castigar seus fiéis servos ou subtrair-lhes sua benção.

Mas essa doutrina revelou-lhe falha, pois a des-graça atingiu um inocente.

E não poderiam ser inocentes tantos outros afligidos pelo sofrimento?

O problema de Jó é o problema da humanidade.

Desde o capítulo 3 evidencia-se que Jó não é mais um caso particular...

3, 3 -16

Sua aversão existencial a tão mísera condição de vida é compartilhada por muitos, imerecidamente amargurados; os extenuados, os prisioneiros, os escravos, que...

3, 21 – 22

Porque só ali encontrarão a paz e liberdade.

Jó se defronta com um cruciante problema, até aqui desconhecido: como justificar um Deus que pune arbitrariamente?

9, 22 - 24

Jó fiel às suas convicções religiosas, aceitara, sem crítica, a terrível provação...

Jó 1,21/ 2,10

Mas por que Deus o teria rejeitado?

Jó se defronta aqui com o mistério em sua própria existência.

Mas com profunda experiência do amor divino, ele ainda espera que Deus volte a manifestar-se em sua bondade...

SOMOS CRIATURAS...

Mas poderá uma frágil criatura ter acesso ao Deus transcendente e torná-lo propício?

Jó apela lembrando que ele mesmo tinha sido bom para com quem precisava... (30,25)

Mas poderá o Altíssimo solidarizar-se com o “homem nascido de mulher, escasso em dias” (14, 1) sem esmagá-lo? Quem poderia ver a Deus e viver? (14, 6)

Vencido pelo sofrimento atroz, Jó amaldiçoa o dia de seu nascimento (3, 1 – 12), sem discutir a absoluta soberania de Deus, que, embora arbitrária, na total desconsideração do mérito ou demérito da ação humana é inquestionável e deve ser acatada.

Jó desanima e vacila, prestes a sucumbir diante do feroz e implacável assédio dos amigos, que teimam em considerar o sofrimento como castigo automático de culpas humanas ou ação punitiva de Deus... (20)

Jó reluta, mas sente o impacto da tentação.

A suposição de que Deus deve ter sempre uma razão moral para afligir o homem parece-lhe infundada e absurda e até mesmo injuriosa a Deus (13, 10).

Mas onde está a verdade? E se eles tivessem razão?

Se a terrível provação tivesse caráter de punição?

Então Deus que o reconhece inocente teria punido-o injustamente?

Ou então teria permitido que forças cegas o destruíssem?

Por quê?

Esse é um doloroso pesadelo contra o qual Jó luta com veemência, apelando com desespero à justiça divina, porque não pode aceitar um Deus injusto e malévolo.

A REGENERAÇÃO

Jó se entregou totalmente ao Deus de amor.

Sua justiça não é como alega Satanás (1, 9 – 11; 2, 4 – 5), tática interesseira: um crédito junto de Deus a ser cobrado em bençãos e benefícios.

Deus não aceitaria tal compromisso.

Jó verdadeiramente ama o seu Deus.

Por isso mesmo lhe é tão doloroso e insuportável a desconcertante ação de Deus, sua atitude de agressiva hostilidade contra um amigo comprovadamente leal.

É noite na alma de Jó, mas a luz divina vem raiando: Corrigindo os argumentos de seu servo fiel, Deus facilmente o convence de sua incompetência em julgar a ação divina em relação ao homem.

Muito mais temerária e totalmente impertinente seria a blasfema pretensão de perscrutar os insondáveis desígnios do Altíssimo.

Jó reconhece o mistério e pede de Deus sua explicação.

Repreendido pela sua falta de sabedoria, ele se penitencia de sua estultícia (40, 5).

Não se trata de uma mera resignação ante o poder transcendente de Deus, mas plena aceitação do mistério e confiante entrega de seu próprio destino nas mãos de Deus (42, 1 – 6).

Acontece em Jó uma profunda transformação e um novo relacionamento com o Criador:

Uma relação de amor mais esclarecido e teológico, impossível em estágio anterior, sem a experiência de aniquilamento.

E Deus, o Deus fiel, manifesta-lhe seu inalterável amor e solicitude por ele.

Jó é amigo de Deus agora mais do que nunca.

EPÍLOGO

A comprovação da transformação de Jó:

Sua intercessão pelos amigos, desleais e agressivos, que não se dignaram interceder por ele diante do Altíssimo.

E não é só Jó que tem motivo de queixa contra eles. Deus também se mostra irritado com sua vaidosa presunção e arrogância...

Uma razão a mais para Jó os desprezar e esquecer...

Mas ele, agraciado por Deus, transcende o padrão da ética do Primeiro Testamente, ao mostrar lealdade para com os falsos amigos e interceder por eles.

E Deus aceitou sua intercessão... (42, 8)

É um alto de perfeição atingido por Jó...

Fiel a seu Deus, é ele exemplo de perseverança na provação e figura do SERVO SOFREDOR...

Is 53

Homem exemplar ao lado de outros...

Ez 14, 14. 20

Tg 5, 11

 

 

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

DIAS DA SILVA, Cássio Murilo. Metodologia de exegese Bíblica. São Paulo: Paulinas 2000. (2ª edição: 2003).

CIPRIANI, Vitório. Curso de Espiritualidade Judaica. (Aulas Expositivas) Itesc, 2004/2005.

GASS, Ildo Bohn. (Org.) Uma introdução à Bíblia – A serviço da leitura libertadora da Bíblia. São Paulo: 2002.