EU ENCONTRO MINHA MÃE AQUI

EU ENCONTRO MINHA MÃE AQUI

 

EU ENCONTRO MINHA MÃE AQUI

(Assunção de Nossa Senhora)

 

            Um padre em uma paróquia começou a notar que todas as sextas-feiras, por volta das nove da manhã, vinha um homem pela faixa dos quarenta anos rezar diante do Sacrário. Tinha sexta que ele chorava, outras ele sorria, outras conversava. Toda sexta, nove horas. Os outros dias da semana ele não vinha, a não ser no domingo, onde sentava-se em um banco com sua esposa e dois filhos.

            Uma sexta-feira o padre não resistiu e aproximou-se:

            - Bom dia!

            - Bom dia, seu Padre!

            - Eu noto que você vem aqui todas as sextas de manhã. Eu vim lhe parabenizar pela sua fidelidade. É raro ver um homem devoto assim como você. Vir conversar sempre com o Senhor.

            - Mas, seu Padre, eu não venho conversar com o Senhor não. Eu venho conversar com minha mãe.

            - Sua mãe... – Estranhou o Padre – Mas aqui, no sacrário!

            - É. Eu já me explico. Meu nome é Lorival. Minha mãe se chamava dona Maria, casada com seu Roberval, meu pai. Eles tiveram cinco filhos. Eu sou o mais velho. E minha mãe com vinte e cinco anos ficou viúva de meu pai. Papai trabalhava em uma fábrica de química. A fábrica não cuidava muito de seus empregados. Papai respirou muito tóxico. E um dia teve um enfarto. Foi encontrado morto no chão da fábrica, perto da máquina que trabalhava. Minha mãe ficou então com a gente. Cinco filhos e ela com vinte e cinco anos. Mas cuidou da gente sozinha. A gente morava de aluguel. Ela costurando pra fora, dava de comer pra gente, mantinha o que a gente precisava na escola e ainda pagava o aluguel. Mulher de Deus com muita fé. Não fazia nada sem antes rezar na sua capelinha. E à noite depois de rezar com a gente, ia rezar mais um pouco. Minha mãe não quis casar de novo. Ela dizia que amava muito o meu pai para que a gente tivesse um outro pai. E contava ainda que quando estava pra ter o meu irmão mais novo, uma vizinha que não ia com a cara dela, começou a fazer macumba pra ela. Dizendo que ela não ia ter o meu irmão. Era uma mulher que não conseguia ter filhos. Às vezes, minha mãe contava, que quando acordava tinha umas coisas estranhas na porta de nossa casa. Ela pegava tudo e jogava no lixo dizendo que o poder de Deus era maior que tudo. Teve o meu irmão saudável. Sem nenhum problema e o parto foi um dos melhores que ela teve.

            Quando eu tinha uns dez anos ela soube que um grupo que morava lá em nosso bairro pertencia ao MST e eles convidaram a ela para ocuparem uma fazenda de um homem muito rico que não a utilizava para nada. Minha mãe, penso que sentiu que aquilo ia dar certo. Era a chance de termos uma casa própria. Foi com todos nós para o lugar. Tudo muito organizado. Ficamos uns três dias debaixo de lonas pretas até que chegou a polícia. Minha mãe acabou sendo uma das lideranças do grupo. O comandante se aproximou e minha mãe tomou a frente, e ele perguntou:

- Quem deu ordens para vocês invadirem essa propriedade?

-A dona Necessidade.

O comandante silenciou um poucoOlhou bem para a minha mãe e disse que no outro dia de manhã, por volta das setes horas eles iam voltar. E se não saíssemos dali, nós iríamos sair com tiros.

   Quando os PMs foram embora, eles começaram as reuniões. Em uma delas uma menina deu uma idéia. Que todo mundo riu. Ela disse:

- E se quando os guardas chegarem e, cada um nós, dermos uma flor para eles?

   No meio dos risos minha mãe disse:

- Esperem! É uma excelente idéia. Não temos mais o que perder. Não podemos sair daqui. Vamos sair sim, mas atrás de flores. E amanhã, seja o que Deus quiser.

    Passamos a tarde atrás de flores. E conseguimos uma flor para cada criança.

    E no outro dia quando os PM chegaram, a criançada toda correram atrás deles com a flor na mão e deram aos guardas. Eu nunca tinha visto guarda chorar. O comandante chegou para a minha mãe e disse para ela:

- O dono dessas terras que venha tirar vocês daqui...

    E assim conseguimos nossas casas e estamos até lá. As terras que era de um só, são de noventa famílias. Essa é minha mãe Sr. Padre. E mais, Sr. Padre, anos depois, ela pegou diabete muito forte e minha mãe começou a sofrer, mais do que tinha sofrido. Um dia, limpando o terreno da casa, tinhba um pedaço de pau com prego. Ela não viu e pisou. E virou uma ferida brava e deu granguena e ela teve que amputar a perna na alutra do joelho. Dava dó minha mãe sofrer. Agente ia acalentar ela e agente que saia conformado. Ela dizia:

- O meu filho! Chegou a hora do sofrimento. Jesus sofreu por nós. A gente têm que sofrer também.

-  Mas mãe! A senhora já sofreu tanta nessa vida!

 Mas ela me atalhava:

- Não meu filho, mamãe não sofreu nada. Agora é que chegou a hora. Nosso senhor sabe o que está fazendo.

    E foi assim Sr. Padre. Ela ficou cega. E depois de tanto sofrimento, ela morreu. Em uma sexta-feira, as nove da manhã. E eu tenho certeza que, pela pessoa que foi, com a fé que em Deus teve, ela está viva. E com o nosso Senhor.

- Mas você não vai visitar o corpo da sua mãe no cemitério?

- “Ochii” Sr. Padre. Cemitério que nada! Lá eu vou de ano em ano nos dia dos finados, só para limpar o túmulo. Minha mãe não está lá não. Santa como foi, eu tenho certeza que ela está aqui com o nosso senhor. Corpo, o espírito, tudo dela. Está aqui com ele. Uma mulher que amou tanto a Deus, só pode estar toda com ele.

    Este é o mistério da assunção de Nossa Senhora mãe de Deus.